domingo, 3 de abril de 2011

A maldade tem bons sentimentos

Em algum lugar Rimbaud teria dito que o amor não tem bons sentimentos. A frase é também título do excelente livro do escritor Raimundo Carrero. Aproveito a idéia para dizer que a maldade também tem bons sentimentos. Tenho pensado na maldade como algo a ser cultivado, assim como a bondade. Explico-me. Cada vez mais acredito que somos pessoas más por natureza. Sempre desconfiei de Rosseau com aquela balela colonialista do mito do bom selvagem. A sociedade não corrompe ninguém. Já nascemos corrompidos. E isso nada tem a ver com o pecado original católico. Isso tem a ver com aquilo que Edgar Allan Poe discute no "demônio da pervesidade". Tem a ver com nossa natureza que pende para o egoísmo da sobrevivência. Sobreviver nos torna egoístas. Nascemos más. As crianças são más. E ao contrário do que se pensa é a bondade que é um sentimento lento e difícil. Durante 34 anos fui bombardeado por pessoas más me dizendo; “Guri fique onde você está”, “Te contenta com isso”. “Não adianta, tu não vais conseguir.” A duras penas percebi, portanto, que não havia nada de errado com as pessoas. O que estava errado era a vida. Sim, culpo a vida por me dar esse olhar patético de bondade sobre as pessoas. Sempre acredito que as pessoas que vou conhecendo são boas. No entanto, sou surpreendido com atos de maldade, mesquinharias. Mas não guardo rancores. Não lamento. Não tenho nada a ver com as lamentações. É por isso que escrevo. Escrevo pelo único motivo que vale apena escrever: para me vingar da vida. Para mim, a vida deve satisfações à literatura. Meus escritos são um acerto de contas com a vida. Entretanto, para cobrar dela, é preciso cultivar um pouco de maldade. É dessa maldade que estou falando. Dessa que nos protege. A maldade que nos move a erguer um ímpeto sobre a vida, e nos permite discordar dela. Como um ato divino. Ser Deus em nós mesmos. Desde que o mundo é mundo, Deus vêm praticando suas maldades. Deus envelhece na violência dos leões. Tenho esse Deus dentro de mim. Deus sábio. Não estou fazendo nenhum elogio à maldade. Estou apenas cobrando o direito de uma explicação. A vida tem de se explicar. Uma temporada no inferno não faz mal a ninguém. Por isso insisto: A maldade tem bons sentimentos. O mal purifica. Dostoiéviski que o diga. O amor é doloroso, por isso não tem bons sentimentos. Como a vida. Entre a maldade e bondade prefiro os dois.

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